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5 de jul. de 2012

Parnamirim na Segunda Guerra Mundial

Fonte: Fundação Rampa
 

Introdução
A Segunda Guerra Mundial transformou drasticamente e de diversas formas os cinco continentes do planeta, sendo até hoje o maior conflito armado da história. Na América, em especial, a região Nordeste do Brasil foi uma das áreas afetadas, pois, apesar de não estar dentro do cenário de conflito direto da guerra, no início dos anos 40 transformou-se num ponto de passagem dando um destaque ainda maior à cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, com a instalação da maior base militar norte-americana fora dos limites dos Estados Unidos.
Contudo, a importância do local é bem mais antiga, contrariando o imaginário popular que acredita na inexistência de Parnamirim antes da passagem dos americanos. Como Natal desde a década de 20 era passagem obrigatória das aeronaves de diversas partes do mundo – França, Alemanha, Itália, entre outros, inclusive, Japão e Austrália – devido a sua proximidade com o continente africano, se tornou necessário o incremente logístico para atender o revolucionário meio de transporte, o que originou o campo de pouso de Parnamirim, em 1927.

Exploração Francesa
No ano de 1925, a empresa de correio aéreo francesa Latécoére manda ao Brasil, via navio, uma série de aviões, pilotos e mecânicos, para explorar a viabilidade de implantar no País o serviço de correio aéreo. No início, sem aeródromos, os pilotos exploradores eram obrigados a pousar em descampados, principalmente praias, consolidando o trajeto Rio de Janeiro-Recife. Quando, em 1927, já com autorização do Governo Federal os franceses implantaram a linha regular Recife-Buenos Aires (Argentina). Nesse mesmo ano, tendo em vista a futura união aeropostal entre Paris e Buenos Aires, a Latécoére envia a Natal o piloto Paul Vachet com a missão de encontrar uma área para construir um aeródromo potiguar.

Avião da Latécoére após pousar na beira mar. Exemplo de como Paul Vachet fez ao aterrissar na praia da Redinha, em Natal, no ano de 1927.

 

"Campo Francês" ou "Campo Parnamirim" concluído em 1927
Com o auxílio do coronel do Exército, Luís Tavares Guerreiro, por dois dias Paul Vachet tentou localizar um terreno plano e ideal, no entanto, não obteve sucesso. Por ser caçador e um profundo conhecedor da região, o oficial Guerreiro sugere então uma área a 20 quilômetros da cidade, uma imensa planície cujo o solo arenoso e duro era coberto por uma vegetação rasteira, porém, o acesso era possível apenas pela linha férrea da Companhia Great Western, no que depois ficaria conhecido como “Campo de Parnamirim” ou “Campo dos Franceses”. O terreno pertencia ao português Manoel Machado, comerciante em Natal, o qual foi procurado pelo francês e de imediato autorizou em cartório a cessão das terras."Campo Francês" ou "Campo Parnamirim" concluído em 1927
Em 15 de outubro de 1927, pouco após a pista ser terminada, recebe então o seu primeiro pouso. Tratava-se dos pilotos Costes e Lê Brix, franceses que participavam de um raid internacional (quebra de recorde). Não eram da Latécoére, porém, seria a primeira vez que uma aeronave faria a rota África-Natal, sem escalas. O tão sonhado plano francês de unir Paris a Buenos Aires, por uma rota totalmente aérea, só ocorreria em 1930, quando Jean Mermoz partiu do Senegal, pousando em Natal com mala postal parisiense destinada a todos os locais da América do Sul.
As famosas linhas Latécoére foram vendidas em 1928 e renomeadas CGA ou simplesmente Aeropostale, que enfrentou um processo de falência judicial e foi nacionalizada em 1933, tornand-se junto com outras empresas a atual Air France, que operou no Brasil até a rendição francesa em junho 1940 aos alemães. Curiosamente, alguns meses antes, a Linee Aeree Transcontinentali Italiane (LATI) se estabelece vizinho aos franceses em Parnamirim, e a Itália viria a declarar guerra à França em maio daquele ano, logo, por um mês os dois inimigos compartilharam a mesma pista. A vida da LATI no Brasil também foi curta, devido a guerra e o bloqueio americano de combustível, a empresa deixa o País em dezembro de 1941.
 
Auge do campo com a presença dos americanos
Com a queda da França para a Alemanha na Segunda Guerra, o governo dos Estados Unidos preocupado com o estabelecimento de bases do Eixo em territórios franceses nas Américas, passa a ocupá-los, e como o Brasil era um país soberano aqui não puderam fazê-lo, portanto, em 1941, a alternativa foi um acordo com o governo brasileiro no qual uma empresa americana – Pan Am – através de sua subsidiária Airport Development Program (ADP) ocuparia esses aeroportos com o intuito de desenvolve-los. A obra começa em Parnamirim em julho de 1941, mas na realidade todo o dinheiro empregado pela ADP vinha do governo norte-americano que tinha interesse em ter pistas de pouso na rota da África para exportação de aviões destinados aos ingleses, que já combatiam os italianos e alemães no norte daquele continente desde 1940.
A mesma situação vivida pelos franceses e italianos, entre maio e junho de 1940, “inimigos e vizinhos”, voltou a se repetir quando chegam os americanos em 1941 para desenvolver Parnamirim sob a administração do ADP. Embora não inimigos declarados, na realidade os EUA estavam totalmente do lado inglês contra o Eixo, do qual a Itália fazia parte. No desenrolar, os americanos começam a construir as pistas novas e são regularmente espionados pelos italianos que sobrevoavam a obra para fotografar. Começou o embate diplomático afim da expulsão da LATI pelo governo brasileiro sob o pretexto de espionagem, mas antes disso, em dezembro de 1941, os Estados Unidos entram na guerra e cortam totalmente os suprimentos de combustível dos italianos, agora inimigos declarados que sem alternativa fogem deixando para trás aeronaves, edifícios, enfim tudo.

 
 Fotos do início da construção de Parnamirim Field. Arquivo: LIFE

Tem início então, o que seria a ser Parnamirim Field, a maior base americana fora dos Estados Unidos. Uma vez em guerra não havia mais a necessidade de disfarçar os motivos pelos quais os civis americanos realizavam obras, então começa a chegar os primeiros militares do Air Corps Ferrying Commands (ACFC). O primeiro de todos, o então segundo-tenente Marshall Jamison que no início comandava a si próprio com a missão de dar apoio logístico as tripulações a caminho da África, em janeiro de 1942, ocupando o hangar dos franceses.
Já o hangar da LATI, que estava vago e ainda equipado inclusive com um avião, foi ocupado pelo Exército Brasileiro. Missão: espionar o movimento dos americanos. Essa situação não se estendeu por muito tempo por dois fatores; o primeiro é que todas as instalações existentes (LATI e Air France) com a pista, passaram a ser a Base Aérea de Natal (Bant) criada em março de 1942 e o segundo é que os primeiros prédios da base americana conhecida como Parnamirim Field já haviam sido completados. Vale ressaltar que o Brasil, nesta época, ainda não estava em guerra, contudo, permitiu a operação dos americanos devido ao Tratado de Havana, assinado em julho de 1940.
Tal acordo, previa que qualquer nação do continente americano que fosse atacada por um país não-americano, todas as outras se aliariam contra o atacante. Após 8 de dezembro de 1941, quando os EUA entram oficialmente em guerra, era de se esperar que o Brasil também o fizesse, mas opta em apoiar o americano sem declarar guerra. O fato criou um mal estar com os alemães, que diplomaticamente assim como os Estados Unidos, passaram cobrar uma posição dos brasileiros, quando em janeiro de 1942 o governo do Brasil rompe relações diplomáticas, entretanto, a decretação do estado de guerra viria a ocorrer oito meses depois.

Hangar abandonado pelos italianos e já ocupado pelos brasileiros.
  
Enquanto isso, a construção das bases aérea de Natal e Parnamirim Field proporcionou um crescimento econômico nunca antes visto no estado, gerando cerca de 6 mil empregos e atraindo trabalhadores da capital, interior e outros estados, além das empreiteiras, todas nacionais e trabalhando em três turnos, 24 horas por dia. O lado negativo do avanço, com excesso de dinheiro circulando e o inchaço populacional, foi um alto índice inflacionário pois a cidade, com 40 mil habitantes, não estava preparada para receber tanta gente, sem condições de ampliar a produção de comida, aumento dos alugueis e das casas de prostituição. Uma das soluções encontradas pelos americanos, foi a criação de um aviário ou criação de galinhas com horta, no local onde hoje existe a Cidade da Criança, como relatou John Harisson.
A princípio, antes do rompimento diplomático com a Alemanha, o governo brasileiro permitia apenas seis aeronaves norte-americanas em território nacional. Após janeiro de 1942, apenas em Parnamirim Field, estima-se que pelo menos 100 pousos e decolagem ocorressem diariamente, com relatos de até 300 em dias de pico, resultando numa média de 3 minutos a cada decolagem. Um dado curioso é que a dificuldade de navegação entre o Brasil e a África e a deficiência tecnológica à época, exigia a decolagem apenas à noite, pois a navegação seguia as estrelas, a exemplo dos primeiros navegadores.

 










 Base americana em 1942 e o local atual, onde funciona a Base Aérea de Natal.

Sobreviventes do submarino U-164 afundado na costa nordeste do Brasil. Nesta ocasião eram embarcados num Catalina do VP-83, em Parnamirim Field, como prisioneiros de guerra


Última edição de jornal, em inglês, editado em Parnamirim. 
Janeiro de 1946. "Nossa última ediãção - Saudamos o Brasil", diz a manchete.


Parnamirim Field tinha duas seções; uma, o Air Transport Command (ATC), antigo ACFC, do exército e a outra composta por unidades de combate da marinha americana. O primeiro esquadrão a ser baseado em Parnamirim foi o VP-83 – Esquadrão de Patrulha – com aeronaves PBY-5A Catalina, chegando em abril de 1942. Tais aeronaves eram anfíbias, ao contrário dos PBY-5 Catalinas do VP-52 que ocuparam a Rampa, entre dezembro de 1941 e março de 1942. A Rampa só voltaria a ter unidades de combate americanas em dezembro de 1942, com a chegada dos primeiros Martin Mariner do esqudrão Vp-74.
Por ser a maior base norte-americana, Parnamirim recebeu equipamentos de guerra inovadores, pois além das aeronaves PBY-Catalina, a marinha também utilizou o PV-1 Ventura e o PB4Y-1 Liberator. Já o ATC, despachava para diversas partes do mundo o C-46, C-47, C-54 e C-87 para transporte e a caminho dos fronts norte África, Oriente Médio, Itália, China, Burma e Índia, a United States Army Air Force (USAAF) passava com seus B-24 Liberator, B-25 Mitchell, B-26 Marauder, A-20 Havoc e alguns P-38 Lightning. Além desses, passaram aviões de fabricação americana, porém, destinados à Royal Air Force (Inglaterra) já com pinturas especificas.Um dado importante e pouco conhecido, é que as primeiras Super Fortalezas Voadoras, Boeing B-29, a bombardear o Japão, do 40th Bomb Group, tiveram que passar por Natal para chegar em bases aliadas na China, lembrando que os territórios conquistados no Pacífico ainda ficam fora do raio de autonomia do B-29. O Jack, colaborador da FRAMPA, contou que no dia da passagem dessas aeronaves por Natal foi determinado a proibição de se fazer fotos, uma vez que a aeronave era tida como secreta e, por isso, ficou cercada por marines.
Essa movimentação diminuiu no fim de 1944, até a guerra acabar quando em 1945 se instalou o Green Project (Projeto Verde), no qual organizava o retorno das tropas e aeronaves americanas, até então ocupando bases da África até a China. Em 1946, Parnamirim Field é entregue ao Brasil e deixa de existir passando a integrar a Base Aérea de Natal. Desde então, o lado brasileiro ficou conhecido como “base oeste” e o lado americano ou Parnamirim Field como “base leste”. Ainda em operação, a BANT é responsável pela formação dos pilotos de caça da Força Aérea Brasileira (FAB), através do 2/5 Grupo de Aviação.

Quartel-General do Air Transport Command do Atlântico Sul. Na foto, oficiais brasileiros em visita a base americna. O prédio original foi demolido, restando apenas as fundações.
  
Edificações originais da década de 40 e ainda preservados na BANT. O teatro ao ar livre e a igreja, ao fundo.
 
 

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